terça-feira, 4 de janeiro de 2011

PARA REZAR NO DIA DE REIS - 06 DE JANEIRO

SEGUINDO OS MAGOS “no caminho do divino serviço” (EE. 260)

(Texto do Padre Adroaldo)



Teilhard de Chardin manifestou, repetidas vezes, o desejo de que a solenidade da Epifania mudasse de nome, ou ao menos de prefixo. Para ressaltar que festejamos o dia em que Nosso Senhor Jesus Cristo se revela em plena transparência, como fundamento de tudo e de todos, fonte e fim, alfa e ômega, esta solenidade deveria denominar-se “dia-fania” em lugar de “epi-fania”.
Porque não se trata propriamente de uma repentina irrupção de Quem é seu Criador e Salvador, senão muito mais de uma misteriosa e silenciosa “dia-fania”, mediante a qual Cristo ilumina o verdadeiro fundamento de todos os seres, agindo neles e por eles, para conduzir todos à sua plenitude, até que Deus seja tudo em todos, na realidade total (1Cor. 15,28).

Teilhard declara que não lê a história dos Magos como uma “verdade fotogrática”, senão como uma verdade que nos ilumina sobre Aquele que enche o universo com sua presença dinâmica; sobre Quem dá sentido à nossa história; sobre Aquele que, em tudo e para todos, é o Deus sempre maior.
Essa “dia-fania”, essa “transparência” de Deus “em todas as coisas criadas” é a que deslumbrou e desconcertou Inácio.
No mistério deste dia, a procura de Deus passa pelo livro e pela estrela. Colocando o “princípio e fundamento” da aventura no Espírito a que nos convida, Inácio afirma que não existe para o homem caminho de autêntica busca de Deus que não passe, como no mistério dos Magos, pelo livro e pela estrela, por uma inserção no mundo criado; e que, por outro lado, toda solidariedade com o ser humano e todo compromisso com o mundo criado, para serem autênticos, pressupõem a descoberta de Deus.
S. Inácio fundamenta sua experiência nessa visão, nessa mística da presença de Deus em sua obra, nessa contemplação “dia-fânica”, de uma criação chamada a tornar-se novamente justa e bela, verdadeira e pacífica, unida e reconciliada, intimamente unida a Deus, como no primeiro dia.

Mateus nos apresenta os “Magos do Oriente”: algo bastante inesperado e até estranho. Desconhecia a advertência de Lev. 19,31? “Não vos voltareis para os necromantes, nem consulteis os magos, pois vos
contaminariam: Eu sou o Senhor, vosso Deus”.
Ou então Mateus teria a mentalidade moderna segundo a qual no Ocidente já não havia nada de novo a descobrir, enquanto do Oriente vem uma luz encantadora e exótica?
Em todo caso, esses insólitos Magos, profundos investigadores do céu, sentem-se aguilhoados pela mesma pergunta de André e João: “Mestre, onde moras?” (Jo. 1,38).
O que faz tão palpável a pergunta é uma estrela, que não funciona só como meio, mas também como objeto de comunhão, como instrumento de união.
Os Magos consultavam os astros do céu para compreender o caminho dos homens na terra. Pois esses magos, examinando os céus, descobriram uma estrela brilhante como nenhuma outra. E ficaram fascinados com o brilho.
A estrela, porém, moveu os magos a que deixassem de olhar para ela; que olhassem antes para o lugar, na Terra, que a sua luz iluminava.

Quando os Magos desviam-se da rota de Belém e entram em Jerusalém, para perguntar onde é que estava o rei dos judeus recém-nascido, a estrela desapareceu de sua vista. Como que para dizer que não é na riqueza e no luxo das cortes que a Luz de Deus brilha para os corações
É na simplicidade e pobreza de uma criança que resplandece a luz de Deus.
Foi assim que a longa jornada dos Magos começou, seguindo o caminho que a luz da estrela indicava. E ao final de longa peregrinação chegaram ao lugar procurado.
“Banhado pela suave luz da estrela, em meio a vacas, jumentos e palha, se encontrava um nenezinho. Eles, então, foram iluminados. Não pela luz da estrela, mas pela luz da criança.
Perceberam que sua busca havia chegado ao fim. Aquilo que os adultos esqueceram e que a sabedoria busca – as crianças sabem.
Ser sábio é ser criança. O universo é um berço onde dorme uma criança. E desde aquele dia eles deixaram de olhar para as estrelas e passaram a olhar para as crianças.
Os sábios vêem o avesso. O avesso é esse: os adultos são os alunos; as crianças são os mestres. Por isso os magos, sábios, deram por encerrada a sua jornada ao encontrarem um menino numa estrebaria...
No Natal, todos os adultos rezam a reza mais sábia de todos, escrita pela Adélia Prado:
“Meu Deus, me dá cinco anos, me dá a mão, me cura de ser grande...” (Rubem Alves)

O texto dos Magos nos revela que a Palavra de Deus não foi confiada exclusivamente às Escrituras e aos exegetas; manifesta-se também no livro aberto da noite que canta a glória de Deus quando se vive a noite na atitude do sentinela à espera do despertar da aurora, do dia novo.
“Vimos no Orienta sua estrela e viemos para adorar o Senhor” (Mt. 2,2).
Quando S. Inácio nos propõe à contemplação este mistério da vida de Cristo, repete 4 vezes o verbo “adorar”: vir para adorar, antes de regressar por outro caminho.
A adoração se concretiza em seus presentes; mas se os Magos não tivessem oferecido mais que presentes, não teriam oferecido nada. Na adoração “se oferecem a si mesmos”.
Os Magos, cuja profissão consiste em investigar, discernir, ver, não vêem senão um Menino, mas reconhecem nele Aquele que ultrapassa infinitamente sua visão: essa fragilidade infantil transparece (diafanicamente) a glória de seu “Rei Eterno e Senhor universal” (EE. 97).

Os Magos poderiam ajudar a Herodes a encontrar o Rei esperado por seu povo, mesmo que esse reconhecimento implicasse para ele a impossibilidade de continuar reinando como reinava. Teria que empreender, como os Magos, “outro caminho”.
Os Magos voltaram convertidos em portadores de Deus. O encontro com o Senhor transformou-os. É que Deus não se manifesta verdadeiramente senão revolucionando nossos corações.
Na Epifania não nos é notificada uma mensagem, não nos é comunicado um ensinamento.
A Epifania consiste no encontro do Recém-nascido com os Magos; o reconhecimento recíproco transforma os Magos em testemunhas vivas da Boa-Nova. Transformados, eles mesmos se tornam Boa-Nova e assim anunciam, em diálogo vivo, a Luz das nações.

(cf. Kolvenbach – Discurso na C. Geral 34ª (6 de janeiro de l995)

Na oração:

Esse “outro caminho” é o caminho que deve direcionar para Deus nossa vida.
Pusemo-nos a caminho, arrastando os pés ou “esforçando-nos por ir adiante no caminho do serviço divino” (EE. 260), e até mesmo postos a “correr” nos caminhos de Cristo Nosso Senhor?
Ou, pelo contrário, perdemos o caminho e são sabemos para onde vamos? A quê estrela seguimos?
O que importa é pôr-se a caminho nas pegadas dos Magos, fazer escolhas e recusar desvios; trata-se de nos comprometermos “mais em obras do que em palavras” (EE. 230), lançarmo-nos pessoalmente a ações concretas.

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