terça-feira, 31 de julho de 2012

Convite.

Amigos da Comunidade Loyola,

Convidamos a todos da comunidade para a missa da solenidade de Santo Inácio, que será  celebrada hoje, 31/07, às 19h15min, pelo Padre Geraldo Lacerdine, e para o Colóquio com o Padre Ulpiano Vázquez Moro, com o tema Atualização das inspirações Inacianas para a vida em nosso tempo, amanhã, 01/08, às 19h, ambos no Teatro Padre Francisco Rigolin (auditório do Colégio).
Mais informações pelos telefones 31 3337-7700 // 9614-6870 ou na sala da APL.

Abraços fraternos,

Licínio Andrade Gonçalves
Pai Voluntário na APL

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Sugestão de oração para o próximo domingo.


Passagem do “partir o pão” para o ser “pão partido

“Jesus tomou os pães, deu graças e distribuiu-os...” (Jo. 6,11)

Do pão de trigo ou cevada para o pão do sentido de vida doada; do alimento de cada um para a circulari-dade do alimento partilhado, em pequenos grupos, sem templo, na gratuidade e frugalidade...
Este é o sentido do texto joanino, proposto para este domingo.
Longe do templo e das autoridades judaicas, seguido por uma multidão, Jesus sinaliza para uma Páscoa centrada na pessoa dele, aberta a um processo de partilha, comunhão e retorno de vida abundante para todos. O congraçamento de Israel, durante a festa da Páscoa, no Templo, é substituído pelo congraçamen-to em torno de Jesus, no lugar onde Ele estiver, com a multidão que o segue.
Mas, enquanto a Páscoa no Templo favorece os controladores dele, a Páscoa em torno de Jesus favorece e engrandece a todos.

Naqueles vastos campos da Galiléia, Jesus propõe a grande mesa da comunhão universal, a mesa “fora dos templos” que inclui a todos, sem distinção. O gesto da benção instaura o horizonte da partilha, em que as coisas são destinadas à necessidade de todos por meio da co-responsabilidade dos participantes no banquete da Criação, sobre cuja mesa Deus preparou pão em abundância para todos.
A comunhão bíblica se realiza entre os “distantes”, por meio de um gesto que não é de poder, mas de esvaziamento, não é de apropriação, mas de partilha, não é de fechamento, mas de abertura das mãos que acolhem, que distribuem...
A mesa da refeição se torna lugar de humanização do ser humano. Espaço de verdadeira reserva de humanidade. Muitos são aqueles que sabem abrir as mãos, partir o pão, saciar a fome do irmão.
É nesse universo de mesa-refeição que o ser humano vai se auto-construindo, auto-definindo como ser que é humano, mas também divino. Diviniza-se humanizando, humaniza-se divinizando.

Sentar-se à refeição com o outro é descobrir-se vivo, corpo pulsante, latente, carente.
Mas é também descobrir um outro tipo de alimento, que só pode ser colhido na delicadeza da inter-relação, da inter-comum-união com o outro. “Eu não quero pão, eu quero fome” (Adélia Prado)
A mística da refeição, convida, convoca e se coloca na vida do ser humano como fator determinante de sociabilidade, de valores e equilíbrios sociais, enfim, de humanização.
Nela e com ela aprendemos a acolher o outro como dom. Aprendemos a nos doar, a partilhar, a receber, a escutar e a falar, a contemplar o outro em sua singularidade. A mesa-refeição é também o lugar onde acolhemos a dor e as tristezas do outro, o lugar do suporte das relações, espaço que garante o sustento, que alimenta o corpo, o emocional, o psíquico, o espiritual e o social.
Lugar fecundo, onde o imprevisível pode acontecer.

Seduzidos pela mística da mesa que nos santifica, religamos amizades, afetos negados, histórias esqueci-das, fatos, compromissos...; a mesa congrega para celebrar as alianças restabelecidas; junto à mesa é inevitável a mudança de corações e vidas.
Modelada pelo ser humano, a mesa, ao mesmo tempo modela todo aquele que dela se aproxima; na perspectiva cristã, a mesa desperta em nós aquela sensibilidade e delicadeza de servidores, como Jesus teve, ao se prostrar com o avental, aos pés dos apóstolos para lavar-lhes os pés.
A mesa e a refeição foram o “areópago” do pão, dos afetos, dos desejos de relações livres, de compromisso, de justiça e de solidariedade vividos por Jesus durante sua peregrinação, passando de mesa em mesa, até se deixar também, numa mesa de refeição e de festa: a da sua Páscoa.
Podemos dizer que a mesa tem um “quê” de mistério pascal, pois ela nos capacita para acolher o inesperado que vem: o “outro” em sua aflição, em sua fome, em sua dor.Então nela, o coração humano encontra repouso, alento, força e vigor para caminhar com sentido de viver

Diferente de todos os outros evangelistas, os quais afirmam que a preocupação com a alimentação da multidão nasce dos discípulos, João diz que vem de Jesus. Ele se antecipa e questiona os discípulos.
Enquanto a multidão se aproxima, Jesus já sabe o que ela busca e sabe também que resposta precisa dar. Na resposta de Filipe, representante dos discípulos, aparece a distância existente entre a novidade de Jesus e a prática da tradição.
Na Páscoa do Êxodo, as pessoas comem às pressas, em pé, pães sem fermento, cordeiro assado e ervas amargas, cingidos, para viajar imediatamente (Ex. 12,8-11). Nesta Páscoa, elas comem organizadas em grupos, sentadas na relva, tranqüilamente, sem pressa, pães de cevada, o tanto que necessitam para ficarem saciadas, e ainda sobra muito, para o futuro.

Segundo João, enquanto Filipe justifica a impossibilidade de solução, André procura uma alternativa e se depara com cinco pães de cevada e dois peixinhos nas mãos de um menino. Filipe ocupa seu tempo e sua inteligência em buscar justificativas para o impasse e desculpas para não ser responsabilizado.
André encara a realidade e se ocupa na busca de solução. Encontra um sinal. Há pão, é de cevada, não de trigo, é pouco, mas o menino, pessoa que está começando a vida agora, coloca à disposição.
Jesus é o primeiro responsável, mas quer partilhar com os seus. Isso exige a participação de todos. Ele toma os pães e dá graças. Nós, geralmente, só damos graças quando temos em abundância, porque, a nosso ver, é a abundância que significa graça.
Jesus dá graças por cinco pães e dois peixinhos diante de cinco mil pessoas famintas. É a gratidão sobre o pouco que faz o muito. É pouco, mas é dom de Deus, e dom pode-se multiplicar, pois a graça partilhada tem alcance ilimitado.

Todos acompanham com atenção os gestos de Jesus: coração em ação de graças, olhos fixos, ao mesmo tempo, no pão enquanto o parte e na multidão ao seu redor. Primeiro dá graças à Fonte da vida. Segundo, contempla o pão, fruto da terra e do trabalho de muitos homens e mulheres, que deve ser partido e compartilhado. Terceiro, convida a repartir e... assegurar-se de que a distribuição é justa.  
Depois da ação de graças, o pão se multiplica, tem para todos, o quanto necessitam, e ainda sobra abun-dantemente. Quanto mais se partilha, mais se tem. A fome desse momento foi saciada, mas a vida conti-nua. Jesus ensina como repartir, isto é, como as pessoas precisam ser umas com as outras.
A abundancia de alimento é graça de Deus, mas é igualmente empenho de cada pessoa e de todas juntas.

A Páscoa do pão sinaliza para a novidade do Reino inaugurado por Jesus. Em primeiro lugar, mostra que a vontade de Deus é abundancia de vida e isso se obtém com o pão necessário de cada dia.
Em segundo lugar, evidencia que a garantia da abundancia está na partilha, e isso acontece com a partici-pação de todos. Em terceiro lugar, ressalta que a partilha a-contece quando há corresponsabilidade efetivamente soli-dária que leva a colocar, em comum, tudo o que cada um tem.
Mas não termina aí; a Páscoa do pão sinaliza para a Páscoa da vida que se faz pão e do pão que permanece sempre.

Texto bíblicoJo. 6,1-15

Na oração: Descubra na sua mesa o seu pão; na sua jornada,
                       o seu chão; no seu cotidiano, o inesperado que
                       vem, o outro em sua fome, em busca de mãos abertas que saibam partilhar.  

domingo, 22 de julho de 2012

Texto para refletir o evangelho de hoje.


DESCANSAR: VERBO DIVINO QUE NOS HUMANIZA



“Vindo sozinhos para um lugar deserto e descansai um pouco” (Mc. 6,31)



É comum medir as pessoas pela sua capacidade de trabalhar, produzir.

Por que não definir as pessoas pela sua capacidade de descansar?

Só quem aprendeu a arte de descansar sabe trabalhar e relacionar-se com verda-deiro humanismo.

            “Diz-me como descansas e eu te direi como trabalhas e tratas os outros”.

O descanso humaniza o trabalho e o clima das relações que cultivamos com os outros. Descansar é, portanto, uma questão de justiça social, um imperativo de caridade fraterna.

Muitas vezes os outros são obrigados a pagar a fatura do nosso cansaço, do ativismo em que nos envolvemos. Tornamo-nos “cansativos”.

Só quem vive reconciliado, em 1º lugar consigo mesmo, é que pode descansar como Deus manda.

O descanso não é uma fórmula mágica de relaxação dos músculos e nervos, uma receita automática de ritmo biológico. É sobretudo um modo construtivo de encarar a vida, um clima de paz interior que se cultiva, um coração disposto a amar em todas as estações, sem condições nem fronteiras.

Não se trata de ociosidade egoísta, mas do cultivo da paz e da alegria, ao serviço dos outros.



Na sociedade contemporânea, o trabalho invadiu também o domínio do lazer e do tempo livre; estes devem ser, acima de tudo, “produtivos”. Para muitos, para tirar o máximo proveito do “tempo livre”, é preciso planejá-lo e organizá-lo. Férias e fins-de-semana são admitidos não como um fim, mas simples-mente porque aumentam a produtividade. O excesso de “stres” é inimigo do bom desempenho.

A própria palavra “entretenimento” indica o desejo de não parar. É a busca de algo que nos distraia para que não possamos estar totalmente presentes.

A diversão nos mantém na superfície de nós mesmos, evitando o confronto com as grandes questões da vida (medo de confrontar-nos com as questões vitais de nossa existência; medo de deixar aflorar situações não resolvidas ; medo do contato com o que é essencial na vida...).

A pergunta que as pessoas fazem no descanso “o que vamos fazer hoje?”, já vem marcada pela ansieda-de. E sonhamos com longevidade quando não sabemos o que fazer numa tarde de domingo.





É altamente significativo que a Sagrada Escritura, logo no início do Gênesis, nos apresente Deus a descan-sar dos trabalhos da Criação (Gen. 2,2-3).

Repousar é uma invenção que tem a marca do próprio Deus Criador, uma ocupação digna de Deus, su-mamente útil. O preceito do repouso sabático do povo de Israel é um ponto fundamental da aliança entre Deus e o povo eleito (Ex. 31,13).

A Carta aos Hebreus sublinha que Deus vive no “descanso eterno”. A infinita solicitude de Deus por toda a humanidade é exercida com suma paz e serenidade, em clima de dinâmico descanso.

O descanso é fundamental para a afirmação de Deus como o Senhor de todos e de toda a criação.

O sábado faz cessar os trabalhos cotidianos e conceder uma folga. É um dia de protesto contra as servi-dões do trabalho e o culto ao dinheiro.

É necessário dar ao descanso a força de transformação e de profecia da meta última que nos espera, ou seja, o “repousar de nossos trabalhos”  em companhia das obras realizadas com o Senhor.

Por que não encarar os tempos de descanso neste mundo como uma antecipação e um ensaio do descan-so eterno, do repouso amoroso em Deus, que continuamente age para o nosso maior bem?

Viver na presença de Deus é caminho certo para viver descansado.

           “Fizeste-nos para Ti, Senhor, e o nosso coração não descansa enquanto não repousar em Ti” (S. Agostinho)



Todo esforço precisa seu descanso, toda atividade pede uma parada.

Não há tensão que não exija um relaxamento, nem atividade continuada que não peça uma recreação. Os cansaços acabam nos revelando que em nossa vida ativa estamos amputando certas dimensões do huma-no. Assim, o descanso, em seu sentido nobre, impede que nos convertamos em meros trabalhadores estressados; ela nos arranca de nossa existência maquinal.

É sintomático o fato de recorrermos frequentemente ao uso da linguagem da máquina para expressar o que buscamos com o descanso: “desconectar”, “tirar da tomada”, “recarregar a bateria”, “recuperar a energia”, “abastecer o motor”... Sutilmente, expressamos deste modo como nos percebemos em nos-sa realidade cotidiana e até que ponto estamos suportando níveis intoleráveis de saturação, de ativismo...



Devemos buscar, em cada circunstância, fazer do descanso uma ocasião de subversão de valores, de ques-tionamento de nossa prática cotidiana, de enraizamento de nossa missão... enfim, de vivê-lo à maneira de Jesus Cristo.

Segundo o evangelho de hoje, as jornadas de Jesus nos evangelhos parecem ser muito esgotadoras: muitos enfermos lhe são apresentados para que os toque e os cure, são muitas as pessoas que se aproximam para escutá-lo, é cobrado em todos os lugares por onde passa, os conflitos com os fariseus...

Jesus sentia os cansaços e as pressões, mas ao mesmo tempo sabia fazer “paradas” para recuperar as forças, para retomar o contato com o sentido de sua vida e de sua missão, para ser Ele mesmo.

Ele possuía uma lucidez que proporcionava uma visão profunda das coisas, no clima de uma paz sempre buscada. Para Jesus, o descanso, entre outras coisas, era um momento de restauração e reabilitação pessoal que lhe permitia mergulhar de novo no cotidiano com maior criatividade.



“Vinde sozinhos para um lugar deserto...” O descanso não é uma “des-conexão” , senão uma “cone-xão” com aquilo que é o impulso fundamental de nossa vida cotidiana. O descanso possibilita afastar-nos do rotineiro e nos faz caminhar ao deserto interior, onde podemos dirigir um olhar contemplativo sobre a vida cotidiana. Nele nos desprendemos do presente e de sua urgência tirana.

Por mais descansos que tenhamos, há cansaços  que só se aliviam através do encontro consigo mesmo, e há descansos que só se conseguem quando nos reconciliamos com o que somos e vivemos.

No deserto nos personalizamos, resgatamos nossa identidade; nele temos a chance de ver a realidade sem instrumentalizá-la, gratuitamente. E só no gratuito é que descansamos.

O descanso nos conserva humanos; ele ajuda a recuperar um ritmo de vida mais humanizante (recupera a pessoa e sua capacidade de estabelecer relações gratuitas com outras pessoas, com a natureza e seus ritmos...). Não basta simplesmente poder folgar; ter acesso ao verdadeiro descanso é recuperar o sentido da gratuidade das nossas atividades e que melhoram a vida e a convivência.

O descanso inspira, nos faz criativos, porque toca as profundezas de nós mesmos e das atividades roti-neiras. “Viver descansadamente” é encontrar um descanso, uma paz interior, uma quietude, uma conso-lação, uma satisfação na vida e nas atividades, e que tem sua raiz na comunhão com Deus que trabalha e descansa. A vida do “contemplativo na ação” é uma vida ativa vivida “descansadamente”, ou seja, na presença de Deus, com o coração centrado n’Ele, fazendo somente Sua Vontade...



Texto bíblico:   Mc. 6,30-34  



Na oração: “Descansar é uma arte. Viver descansadamente, uma arte ainda mais delicada” (J.A. Guerreiro)

                   - seu descanso: tempo de humanização ou mais um stress na sua agenda?

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Para rezar o Evangelho do próximo domingo.


Experiência de encontro com o Cristo das estradas poeirentas



“Se você não mover os pés, não reconhecerá o ritmo da vida”




A palavra “caminho” concentra em si uma das mais profundas experiências do ser humano, revela uma das experiências mais primitivas na sua arte de viver. Viver é caminhar. Em nossas entranhas, fomos feitos com “fome de estrada”. Nascemos com essa inquietude: nossa vida é uma longa jornada. “Temos fome e sede de estrada, e ela está ardendo por dentro”.

Qual é o caminho da vida? É a própria vida, ou seja, o modo como se vive constitui o caminho da vida ou a vida como caminho; isso revela que cada ser humano é essencialmente “viator”, é um caminhante; ele não recebe a existência pronta; não possui ainda a vida em plenitude.

Mais importante que percorrer um caminho é “fazer caminho”. Percorrer um caminho é andar por sendas abertas por outros e já palmilhadas pela tradição. O risco é menor e a certeza mais consistente.

Abrir caminho é explorar o desconhecido, enfrentar perigos e correr riscos. Isto constitui o “meu cami-nho” e a “minha direção” na vida. Não se trata mais de um caminho como algo já feito e construído do qual fazemos uso; trata-se de um caminhar, ou seja, auscultar e seguir os apelos que emergem do cora-ção da própria vida. Nosso caminho pessoal tem de ser desbravado com criatividade, ousadia e destemor. Fazemos o nosso caminho a partir de um centro que é nossa individualidade irrepetível, nossa perso-nalidade. Em outros termos: nunca haverá um simples uso de um caminho feito por outros. Cada um tem de caminhar. Cada um tem de ser caminho.

                “Não tenho caminho novo. O que tenho de novo é o jeito de caminhar” (Thiago de Mello).



A Sagrada Escritura é atravessada pela revelação de um Deus que também empreendeu um caminho em direção à humanidade. O ser peregrino, por parte do ser humano, corresponde ao ser peregrino por parte de Deus. O caminho se converte, então, em caminho para um encontro mútuo, um encontro de dois peregrinos.

Também o cristianismo sempre foi entendido como Caminho e Seguimento de Jesus Cristo. As diferentes espiritualidades são compreendidas como caminhos dentro do único Caminho que é J. Cristo.

Os Evangelhos, portanto, não ensinam chegadas, partidas. Esse é o desafio: “entrar”  no caminho de Jesus é viver em terra de andanças.  É a pura alegria de caminhar e nesse caminhar a vida desabrocha como verdadeiramente humana. Nesse caminhar descobre-se Deus e com Ele todo o sentido do universo.

Guimarães Rosa dizia que a coisa não estava nem na partida e nem na chegada, mas na travessia.

A experiência do seguimento de Jesus é “experiência de travessia”, onde cada um constrói seu caminho diferente, original, não-normal... como Cristo.




No seguimento de Jesus não há caminho, mas caminhos; não há traçado comum, mas trajetórias dife-rentes, ainda que confluentes. São caminhos de cristificação.

Jesus, o Homem dos Caminhos, chama para uma Vida nova. Chama na vida e para a vida e põe as pessoas em movimento, a caminho. A “pegada” que Ele deixa ao passar é sua própria Vida partilhada.

Jesus é o homem que se definiu. Ele tem um sonho, um projeto. E surge diante das pessoas com força pessoal capaz de sacudí-las e colocá-las em movimento. Ele “passa” e sua presença as atrai arrancando-as da acomodação. Faz-se do chamado um caminho, quando se partilha a vida com quem chamou. Res-ponder ao chamado feito por Jesus significa tornar esse chamado um caminho de entrega e de serviço.                                                  



O Evangelho de hoje confirma que a missão requer andanças. A forma de realizar a viagem identifica o discípulo como representante do Reino. A disponibilidade para colocar-se em marcha deve ser total, ime-diata e sem distrações. Não há nada imprescindível para o trajeto senão a vontade de executar o percurso; as autênticas necessidades estão do outro lado do caminho, de maneira que Jesus nos mobiliza na atitude do despojamento como estratégia que evita o imobilismo e a lentidão do deslocamento.

“Nada para o caminho” favorece a fixação unicamente no propósito fundamental da marcha.

Há uma exceção: “um cajado somente”. O cajado exclui, neste contexto, qualquer significado associado a mando, violência, poder, direção. A necessidade do cajado adquire sentido por sua relação ao caminho e por sua condição de símbolo do caminhante. O cajado identifica o discípulo em sua missão itinerante e repele a sedução do sedentarismo.



Os convites de Deus são absolutos e constantes. Se estamos apegados ao que temos, jamais seremos capazes de “fazer estrada com Deus” e participar da preciosa vida que Ele nos oferece.

Pioneiras são as pessoas que vão a lugares em que ninguém esteve antes: “gente de fronteira”.

“Peregrino, peregrino, que não sabes o caminho: aonde vais? Sou peregrino de hoje, não me importa onde vou; amanhã? Nunca talvez. Admirável peregrino, todos seguem teu caminho” (Manuel Machado).

Na estrada do peregrino, há o despojamento, a pobreza, por vezes a fome e a sede, os caprichos das estações, a incerteza dos dias de amanhã. Há a liberdade do espírito, horizontes infinitos, sem limites nem constrangimentos, os ímpetos de adoração, de oblação, de ação de graças.

Há o imprevisto, o acontecimento inesperado, favorável ou adverso, que é o melhor e mais seguro dos sinais de Deus, que comanda o ritmo da marcha, as paradas, as estadias, as partidas, as mudanças de rumo ou itinerário. Há o encontro com “fiéis e infiéis”, companheiros que só por algum tempo “seguem caminho”, ou companheiros que se mantém fiéis, amigos que ajudam, inimigos que espreitam, gatunos que roubam, pobres que compartilham o mesmo pão.



Quando compartilhados, os caminhos transformam os caminhantes. As pessoas aprendem a se desfazer do supérfluo, a acelerar ou retardar o passo, a partilhar dramas, a ouvir e a falar, a experimentar a humil-dade de pedir acolhida... Enfim, achegar-se ao próprio coração.

Finalmente, a Estrada aproxima o peregrino cada dia, a cada instante, da meta ainda escondida, mas certa. Ao voltar-se para trás, ele se dá conta de que o itinerário foi realmente maravilhoso, que a experi-ência o transformou, que está mais puro”, mais livre”, mais autêntico”... numa palavra, que Deus, que está no têrmo, já palmilhava a Estrada com Ele.


Textos bíblicos:     Mc. 6,7-13



Na oração:  Jesus das estradas poeirentas

                  “Dá-me percorrer contigo, Senhor, tua terra de

andanças. Dá-me seguir-te a Ti somente. 

Tu passaste deixando tuas “pegadas” no pó da estrada, e sem perguntar “por que” muitos te seguem. Vás sem nada, peregrino, caminhando qual romeiro; e vás chamando seguidores, que te seguem sem nada levar. Quem se atreve a pisar descalço tuas pegadas, sempre em marcha? A cidade não é teu caminho, é dura para as tuas sandálias. Gostas de deixar na terra a marca de tuas pegadas.

Senhor dos Caminhos, que tiras as pessoas da segurança, das suas casas, de seus bens... e as atrai para seguir teu passo, feito atalho estreito, um convite para ir onde quer que vás.

Quero ser caminhante, de coração pobre e livre, feito tenda aberta em teu chamado. Amém!”  



- Nas nossas vidas acontece algo de verdadeiro e belo quando nos dispomos a buscar dentro de nós mesmos a razão da nossa existência: falta-nos ainda muito por saber, por ver, por sentir, por desfrutar...

- No “mapa espiritual” de nosso interior ainda existe uma “terra desconhecida”, que proporciona interesse à vida, suscita curiosidade, nos põe a caminho...  Grandes surpresas interiores estão à nossa espera, e a capacidade de continuar procurando é que dá sentido ao esforço e vigor à vida.

- A nossa vida é um êxodo, um sair constante de uma realidade para entrar em uma outra realidade nova.

  O peregrinar é o elemento determinante e com maior valor simbólico para toda a vida.


terça-feira, 3 de julho de 2012

Para rezar o evangelho do próximo domingo.


JESUS, o homem crítico que põe o mundo em crise



“Um profeta só não é estimado em sua pátria, entre seus parentes e familiares” (Mc. 6,4)



Jesus Cristo continua a nos surpreender enquanto referência inspiradora da grande ousadia humana. Ele fez brilhar a “novidade” de Deus nas vilas e cidades da Palestina. Desde seu cotidiano na vida oculta até sua corajosa atividade pública, Ele nos ajuda a reler o Evangelho com olhar novo e coração abrasado.

No encontro com as pessoas, com os conflitos, com os momentos de alegria e com os riscos de sua missão, Ele mostra vigor e coragem de ir além.



Sua postura de mestre e sua atuação desencadeiam no seu povo uma crise, ou seja, rompe com a “norma-lidade doentia” das pessoas e se revela imprevisível e desconcertante.

Na realidade, o ser humano tende a instalar-se , acomodando-se facilmente ao conhecido e se deixando levar pela rotina que evita sobressantos; isso lhe confere uma certa sensação de segurança e tranquilidade: “para quê e por quê mudar...?”  E isso ocorre também com suas idéias, crenças, cosmovisões...

Habituado a ver a realidade a partir de uma determinada perspectiva, custa-lhe abrir-se a outras percep-ções, novas ou desconhecidas.

A crise que Jesus introduz entre os seus visa redimir o ser humano, isto é, tirá-lo de seu horizonte limitado e estreito para elevá-lo a um horizonte amplo, próprio de Deus.

A crise irrompe quando os dois horizontes se entrechocam.

Jesus proclamou uma mensagem que constituia uma crise radical para a situação social, religiosa, polí-tica e humana da época. Proclama o Reino de Deus.

No Evangelho de hoje, Jesus provocou, por suas atitudes e palavras, um cisma nos seus conterrâneos, isto é, produziu uma crise que levou a uma ruptura-decisão pró ou contra Ele.

Jesus é realmente a crise do mundo. Ele veio para provocar uma derradeira decisão das pessoas pró ou contra Deus, agora manifestado em sua pessoa, em seus gestos e em suas palavras.

Ele não foi simplesmente a doce e mansa figura de Nazaré; foi alguém que tomou decisões fortes teve palavras duras e não fugiu a polêmicas



O relato de hoje é surpreendente. Jesus foi rejeitado precisamente pelos seus parentes e familiares. É a primeira vez que Ele experimenta uma rejeição coletiva, não dos dirigentes religiosos, mas de sua comuni-dade familiar, com quem convivera tanto tempo. Jesus se sente “desprezado”: os seus não o aceitam como portador da mensagem profética de Deus. Por isso, fecham-se em sua idéias preconcebidas a respeito do seu vizinho Jesus e resistem a abrir-se à novidade revolucionária de sua mensagem e ao mistério que se revela em sua pessoa. Porque estavam acostumados a ouvir sempre o mesmo, rejeitam-no por ensinar “coisas novas”.

Mas Jesus não se deixa domesticar e nem se acomoda às expectativas de seu povo.

Aos olhos de Jesus nada é mais perigoso para o espírito humano do que vidas satisfeitas, que não inves-tem seu tempo alimentando sonhos e esperanças; mentes sem inquietações, sem o impulso das buscas; corações quietos, acomodados, ajustados, medrosos, covardes, petrificados, sensatamente contentes com aquilo que são e têm.

Há uma “normalidade doentia” que reprime a nobreza potencial no humano. Para Kierkegaard, “ser um homem normal é ser doente”. Há uma saúde fictícia, caracterizada pela ausência de um sentido maior, pela atração ao conformismo coletivo, pelo medo de expor-se, de arriscar-se a ser... pela incapacidade de assombrar-se diante dos acontecimentos e encontros cotidianos. “Tudo torna-se tão normal... e sem sal”; nada afeta, nada causa admiração ou espanto.

Vida morna, sem sabor, sem criatividade;  incapacidade de transfigurar a existência cotidiana.



Aliado ao conformismo e à segurança aparece o medo da mudança. A pessoa fecha-se no conhecido por medo do desconhecido. Marcada pela “normose”, ela fica presa no interior de uma pequena toca.

Para quem não está disposto a ousar transparecer, a prisão da toca pode ser mais atraente do que o desco-nhecido proporcionado pela liberdade. “Em uma cabeça com medos não há espaço para sonhos”.

O medo das trilhas criativas da originalidade gera hábitos fechados, idéias fixas, conservadorismo, rotina sem sentido, ações insensatas (sem sentido, mecânica, automática, sem novidade...); sabe “fazer” mas não sabe “criar”; faz o que os outros mandam e faz bem, mas sem paixão, sem emoção, sem inspiração...; é perfeccionista, para satisfazer as expectativas dos outros e não ser criticado...

Por não viver a partir do interior, a pessoa deixa de ter horizontes, de sonhar, de desejar...; tem medo de fazer a “travessia” pois não tem direção, não tem projeto. Daí o desânimo existencial.



O desafio é este: ousar ir além ou se conformar, evoluir ou estagnar, ser original ou mero repetidor...

Existe em nós um desejo de plenitude e, ao mesmo tempo, o medo de arriscar, a pulsão de vida e a pulsão de morte. A normose está relacionada com a pulsão de morte. É a estagnação ou morte do desejo,  impedindo o fluxo da vida.

Somos convocados a ex-istir, a trazer uma novidade, um canto novo, uma dança nova... Não nascemos para morrer, nascemos para ser. O ser humano é um ser do caminho; cada um se tornará um ser plenamente humano à medida que investir as reservas de criatividade presentes no próprio interior.

Se a pessoa for capaz de escutar o desejo profundo que a habita e atravessar os medos paralisantes, alcançará uma identidade pessoal, ou seja, a capacidade de ser ela mesma. Isto significa romper com os padrões que atendem às expectativas dos outros, transgredindo com o legalismo e o moralismo impostos a partir de fora.

Os “não-normóticos” são aqueles que fazem a experiência da “outra margem”, vislumbram o outro lado, vão em busca das surpresas, das novas descobertas, tocam as raízes mais profundas do próprio ser.



É preciso sair dos trilhos conhecidos e viciados da normose para tomar as desconhecidas e criativas trilhas evolutivas, nas quais o ser humano enfrentará seus medos e florescerá com vigor e ternura; urge fazer o êxodo da estreiteza de nosso ser à largueza do coração.

É uma grande aventura tornar-se humano, sujeito da própria existência, ser dotado de um semblante único e assumir a direção dos próprios passos, realizando assim, a aspiração profunda de seu coração.

O novo sempre vem e sempre nos surpreende. E o risco é a essência de uma vida espiritual integrada.

O risco fortalece, revitaliza, faz fluir a adrenalina através da corrente sanguínea de nossa vida, faz com que de novo mereça a pena viver a vida.

Como são humanamente repletos de vida aqueles que ainda se encantam com as buscas! Sua vida é penosa, sem dúvida, mas repleta de razões, fervor, criatividade, entusiasmo e vitalidade.

O ser humano é um eterno enamorado de esperanças, um ousado, um contestador de tudo.



Ousar também tem a ver com “transgredir”. Nós cristãos seguimos Aquele que é considerado o maior “transgressor” da história: Jesus Cristo.

Como o próprio Jesus, precisamos cultivar a arte de transgre-dir a inércia, o “pensamento único”, a normalidade petrificada

Há sempre um “mais além” com que podemos sonhar.

Transgredir é transcender, é abrir estradas fechadas, é alargar horizontes estreitos, é soltar os desejos algemados.

Transgredir é inventar alternativas. E ousar é transgredir em favor da humanidade.



Texto bíblico:  Mc. 6,1-6 

                            

Na oração: Dar nomes às normoses presentes na sua vida.

                   “Quando foi a última vez que você fez algo pela primeira vez?” (foi criativo, inventivo...)

- O que asfixia, tira a criatividade e o ânimo nas atividades assumidas no dia-a-dia?