sexta-feira, 15 de abril de 2011

RAMOS: adeus ao Templo (Mt. 21,1-17)

Entrada em Jerusalém: “o conflito com o poder até sua raiz última”

Jesus, na sua vida pública, vai revelando que o Deus, apresentado pelos dirigentes religiosos do Templo e em quem eles buscam a justificação de seus poderes, não é como eles afirmam que é, senão que é um Deus que questiona a submissão incondicional às normas do Templo.
Tal denúncia desestabilizou o sistema religioso sobre o qual a instituição sacerdotal se sustentava.
Jesus se tornou um perigo que deveria ser eliminado.
O conflito de Jesus foi o conflito com o poder,  mas o poder levado até sua raiz última.
E a raiz última de todo poder é o princípio definitivo e intocável sobre o qual se sustenta: “Deus”.
Daí que, segundo é o Deus em quem se crê, justifica-se o poder daqueles que socialmente aparecem como seus representantes.
Por isso, Jesus compreendeu que, para mudar o comportamento dos dirigentes do Templo, a primeira coisa a fazer era desmontar o “ídolo” que legitimava o poder autoritário daqueles que oprimiam o povo indefeso. No fundo, o que preocupava Jesus era o problema de “Deus”; e Deus não era como os diri-gentes imaginavam e que estava de acordo com seus critérios e sua posição social.
Deus era tão desconcertante como desconcertante era aquele Jesus que eles tinham diante de si.
Deus, portanto, não defendia os poderes dos dirigentes, tal como aqueles homens autoritários e mani-puladores pretendiam exercer o poder sobre o povo.
Jesus desmontou o “seu deus” e atirou por terra “seus podres poderes”.
Foi exatamente isso que provocou o enfrentamento, que terminou com o assassinato de Jesus.

Este confronto de Jesus com os poderes religiosos ficou evidente na cena da “entrada de Jesus em Jerusalém”. Jesus não entra em Jerusalém como um rei, guerreiro triunfador, na garupa de um possante cavalo, mas de um burrinho que ninguém ainda havia montado.
Jesus é a novidade, rompe com os esquemas e paradigmas. O povo o quer identificar como um messias que vai triunfar e tomar o poder, como um novo Davi, mas Jesus procura fazer descobrir que o poder nunca é mediação para a libertação do ser humano.
Nem o poder econômico, nem o político, nem o religioso solucionam as desigualdades e injustiças humanas, nem sequer criam esperanças libertadoras.

Este é o momento definitivo de atuação de Jesus: com seu gesto Ele atinge o centro do poder político e religioso, encarnado no Templo. Até então seus gestos foram libertadores da pessoa. Agora Ele arremessa diretamente contra o Templo, pois este não dá frutos e nunca dará.
O Templo já não é mais  a morada de Deus, pois Ele foi desalojado pelo  poder sacerdotal; por isso, Jesus expulsa seus representantes. O Templo, o sacerdócio, a lei, não deram frutos libertadores para o ser humano Estão aí, secos e estéreis, e não servem para a realização humana.
Jesus não propõe sua restauração, mas seu término; Ele rechaçou o Templo e o sacerdócio para sempre, por serem improdutivos e manipuladores; Ele pôs em evidência o Templo e o sacerdócio que não servem como intermediários entre Deus e o ser humano.
Jesus colocou o ser humano acima da Lei e diz “não” a uma aliança fundada no culto externo ou ritual.
Rompe com todo o ritualismo e legalismo anterior  e nos oferece uma alternativa encarnada na vida. Não se trata mais de uma imposição baseada na Lei, mas algo que todos podemos experimentar.
Não se realiza no Templo, mas fora do Templo, em nossas casas abertas, em nossas ruas e estradas, onde todos têm acesso e a partilha criativa possibilita que todos tenham vida.
A mesa de Jesus, fora do Templo, estava aberta a todos. Ele não inicia uma nova religião, não cria um novo sacerdócio, não restaura o templo. Ele transcende todas as religiões quando propõe uma maneira nova dos seres humanos relacionarem-se entre si, onde não se faz necessário nem sacerdotes, nem templo, nem culto. O “ser humano” é agora o centro desse culto, que consiste na entrega aos outros.
Não é mais a Lei que impera, mas o amor; não é condenação mas a acolhida e a compaixão.
O templo é a própria pessoa que está acima da lei e do culto.
A relação com Deus não necessita intermediários e a relação entre as pessoas é horizontal.
Todos estão implicados na tarefa criadora superando o medo e confiando uns nos outros.
A é a que faz vencer o medo diante de qualquer tentativa de domínio ou manipulação, e a solidarieda-de é a que possibilita que a vida se multiplique (cf. José Maria Castillo, sj – Deus e nossa felicidade)



O evangelista Marcos vincula a morte de Jesus com o desaparecimento do Templo (Mc. 15,37-38)
Quando Jesus expirou na Cruz, a cortina do santuário rasgou-se em duas partes, de alto a baixo.
A cortina rasgada significa que o Templo é incapaz de conter Deus; Ele é para todos os povos.
O Deus que Jesus revela não é propriedade de nenhuma religião ou sacerdócio e ninguém pode reduzi-Lo a uma verdade única, porque Ele se mostra no amor mútuo e na entrega da própria vida.
Os fariseus e sacerdotes queriam um Deus e um céu que não se contaminassem com os deserdados desta terra; queriam um Templo como lugar de pureza e de perfeição, legitimado por uma ordem que se constrói sobre o sofrimento e a exclusão. Eles não queriam um Templo que fosse a casa dos impuros, dos abatidos e excluídos, dos encurvados e oprimidos, dos leprosos, cegos e coxos...

O Templo, como não pode ser o lar dos filhos e filhas afligidos da casa de Israel, será destruído.
O lugar da Presença que alimentava as esperanças de Israel se converteu em cova de bandidos; o Templo passou a ser gerido pelos traficantes da dor, aqueles que fazem sofrer em nome de Deus.
É um círculo infernal que Jesus quis romper.
Templo de Jerusalém! Não ficará pedra sobre pedra. O Compassivo não quer que se negocie com a dor de suas criaturas. O Compassivo não quer sangue, nem incenso; quer compaixão, ternura, quer justiça, quer que suas criaturas vivam.

Aquele “dia de Ramos” foi uma autêntica manifestação de desafio.
Até então Jesus havia se movimentado mais na clandestinidade, esperando o momento oportuno, a “sua hora”. E essa foi a “sua hora”: desmascarar a manipulação e extorsão com as quais o poder tinha oprimi-do o povo.
Jesus subiu a Jerusalém na festa principal dos judeus. E pela primeira vez se deixa aclamar: “Hosana o filho de Davi”. Desta vez não recusou o papel de liderança, mas deu um outro sentido, porque não se valeu disso para conquistar o poder e sim para desmascará-lo.
Quando os chefes religiosos perguntam a Jesus com que autoridade desafia o poder estabelecido, Ele responde: “Destruí este Templo e em três dias o reedificarei”.
E o evangelista acrescenta: “Ele se referia à própria pessoa”.
O sujeito do culto não é mais o poder, mas a pessoa mesma.
O templo e a lei devem ficar submetidos e devem estar a serviço do ser humano; portanto, este não pode ser objeto de nenhuma manipulação.
Jesus diz que o autêntico templo de Deus é a pessoa e que esse templo não há quem o destrua.
Jesus não pretendeu tomar o poder; simplesmente o colocou em evidência, demonstrando sua falta de resposta ao ser humano e sua capacidade de extorsão e violência.

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