VINHA,
VASTA VINHA DEGRADADA!!!
“Quando o dono da vinha voltar, o
que fará com os vinhateiros?” (Mt 21,40)
Na perspectiva bíblica, a vinha aparece
sempre como aliada do ser humano; ela nos ensina a viver em harmonia com a
água, com a terra e com todos os seres,numa relação de aliança.
A primeira relação do ser humano com a Vinha,
portanto, não é a da posse, mas a da acolhida, por ela ser dada
em herança. Todos os bens da Criação são recebidos por nós deste modo, ou seja,
como dons.
A Vinha,
como realidade doada, convida à compreensão de sua origem, não para dominá-la e
manipulá-la, mas para tornar o dom uma bênção fecunda para todos. A vinha é
dada por Deus em função da vida. Por isso a Vinha é sagrada e é lugar de
contemplação e encontro íntimo com o Criador; ela é o teatro da glória de Deus,
isto é, da manifestação da presença divina.
E o ser humano é
chamado a“trabalhar
com”
o Criador, cuidando da Vinha, para que ela
seja fecunda e alimente a alegria de todos.
O Evangelho de hoje revela que, quando as
pessoas rompem a aliança com Deus e se afastam d’Ele, a vinha fica estéril. Quando uns poucos se apropriam dela como donos,
ela passa a ser o lugar da espolia-ção, da devastação, da morte e deixa de ser
espaço para a convivência fraterna e solidária.
De fato, contemplando a “grande Vinha do
Senhor”, percebemos que o poder-dominação sobre a natureza e o consumismo
exacerbado destruiu o sentido cordial das criaturas e legou-nos um devastador
vazio existencial.
Segundo a revelação bíblica, as
criaturas não estão colocadas umas ao lado das outras, em justaposição, mas são
todas sinfônicas, interligadas. Há uma grande unidade, feita de muitos níveis, de muitos seres diferentes, todos
eles ligados e religados entre si. E, por isso, num profundo e intenso dinamismo.
O drama do ser humano é não se
sentir em comunhão num todo maior e perder a memória de que é parte do todo; é não
se sentir um elo vivo e esquecer que este é um elo da única corrente de vida.
A antropologia bíblica é
iluminadora ao reconhecer a vida humana numa estreita interconexão com outros
seres, como uma teia interdependente.
Ao predominar a auto-afirmação e o domínio do ser humano sobre a Criação, produziu-se a quebra da “re-ligação”
com tudo e com todos. Ele se colocou num pedestal solitário a partir de onde
pretende dominar a Terra e os céus; como consequência dessa atitude temos a
devastação da vinha.
O embrutecimento do ser humano, de sua
interioridade, a perda do gosto pela verdade, pelo bem e pelo belo, o extravio
da ternura e da transcendência, repercutem em falta de respeito pela natureza,
em ruptura com as outras criaturas, em insensibilidade ecológica.
Por sua atitude de arrogância e
de autossuficiência, o ser humano explorou exaustivamente a vinha herdada
e a destruiu, depredou, aniquilou, tomou posse dela... Assim, não foi
respeitoso para com o Criador que a ele reservou a missão de cuidar da sua
vinha e de compartilhar os seus frutos.
Há um clamor generalizado que
emerge da realidade desafiante enfrentada pela humanidade: o planeta Terra
está gravemente enfermo. As consequências trágicas estão presentes por toda
parte: degradação do meio ambiente, diminuição acelerada das fontes de água
potável, desertificação, degelo das calotas polares com a consequente elevação
do nível do mar, grande incidência de furacões e de queimadas, extinção de
milhares de espécies de animais, escassez de alimento, proliferação de doenças,
migrações forçadas...Enfim, o desequilíbrio dos ecossistemas pode comprometer,
de forma irreversível, todas as formas de vida sobre a terra.
Ferir a Vinha é ferir o próprio Criador.Quando
observamos vinhas outrora verdejantes e agora destruídas ou entulhadas
de lixo, uma sensação de violação, de tragédia, quase de sacrilégio, se
manifesta no nosso interior. E uma voz ecoa das profundezas da destruição: “Quê
fizestes de minha vinha?”.
Como seres humanos, somos convocados a
desenvolver uma consciência criatural, em que a Criação deixa de ser vista como
objeto de domínio. Ela é um dom de Deus que deve ser acolhido com reverência,
respeito e louvor. Somente a vivência dessa relação do ser humano com a criação
possibilitará novas relações sociais e ambientais, o novo tempo de paz e
justiça.
É nesse momento dramático que uma nova
cosmologia se revela inspiradora. Em vez de “dominar” a natureza, situa-nos
no seio dela em profunda sintonia e sinergia.
O que caracteriza essa nova cosmologia é o cuidado
em lugar da dominação, o reconhecimento do valor intrínseco de cada ser e não
sua mera utilização humana, o respeito por toda forma de vida e os direitos e a
dignidade da natureza, não sua exploração.
A primeira relação do ser humano com a Criação,
portanto, não é a da posse, nem a da pergunta pelo seu porquê, mas a da acolhida
em seu ser dado. A forma dessa acolhida é o assombro de sua presença e o temor
diante de sua possível perda.
Enfim, a parábola do evangelho de hoje aponta
para uma relação de acolhida agradecida e reconhecida para com a Vinha, pois
ela é o lugar no qual não só existimos, mas somos chamados a uma plenitude de
vida, em aliança e comunhão com o Deus Trindade.
Somos todos “lavradores” encarregados de tornar
a vinha fecunda. Somos todos “lavradores” que temos de prestar contas a Deus
dos frutos de sua vinha, que não nos pertence.
Assim, o exercício do senhorio,
ou a dominação, por parte do ser humano, deve significar respeito
à ação criativa divina e contribuir com o crescimento e a evolução da natureza
em todas as suas dimensões;igualmente, cuidado com o meio ambiente para fazer dele uma fonte de bênçãos, ou seja, de
comunhão com todos e, a partir dele, crescer em harmonia interior e
estreitamento de relações com o próprio Criador.
Texto bíblico:Mt 21,33-43
Na
oração:Mobilizar meus sentidos para ver, ouvir, tocar, sentir
e saborear a beleza de nossa terra.
Considero
minha conexão com esta beleza e como
ela me faz perceber o amor da Trindade ao cosmos, em
constante evolução.
Considero
o novo sentimento de maravilha que cresce em meu coração e como dá novo sentido
à minha missão de colaborador no grande jardim do Criador.
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