CONECTADOS À VIDA – Jo. 15,1-8
“Eu sou a
videira e vós os ramos” (Jo. 15,5)
Se
há algo que caracteriza nosso tempo é a nova consciência de ser rede-comunhão-interconexão-unidade.
Todos já sabemos que tudo está interconectado: a globalidade é interação. Lentamente
vai-se tomando consciência de que formamos parte de um todo. Há em nós uma
necessidade básica de viver conectados com os outros, de entrar em relação com
o mundo.
Este
tempo pede de nós “uma espiritualidade da conexão”, da busca da
experiência da Unidade, de estender pontes entre culturas, raças, sexos,
crenças religiosas, ideologias, de romper fronteiras, de estreitar laços, de
criar espaços acolhedores... Precisamos sair de nossos pequenos círculos para
criar vínculos com tantas pessoas, grupos, organizações sociais e movimentos
que buscam outra globalização, a globalização da solidariedade, da interconexão
responsável, da comunhão universal.
“Conectar computadores é um trabalho.
Conectar pessoas é uma arte” (Eckart Wintzen)
O desafio que se apresenta diante de
nossos olhos é o de sermos fiéis à realidade
para poder descobrir nela a novidade de Deus, uma experiência “mística”
que nos faça tocar o mais profundo de tudo, e como conseqüência, denunciar o
que obstrui e mata este dom novo de Deus.
Também através dos “chips”, “bytes” e “satélites”
de nosso universo eletrônico o Espírito se infiltra.
Através dos circuitos eletrônicos nos
aproximamos da solidariedade universal, da busca da transcendên-cia, da defesa
do meio ambiente, da luta em favor da vida, do compromisso com a justiça...
Nessa direção, a oração cristã é
um grande corretivo, é um convite a sentir-nos com os outros, a conec-tar-nos
com todos e a viver em comunidade. Nela dizemos que nossa origem e nosso
destino é comum (viemos de Deus e voltamos para Deus) e pedimos juntos o
acontecer do Reino.
A
imagem da videira e dos ramos, no Evangelho de hoje, nos revela a
teia das relações, das inter-de-pendências e da comunhão de todos com a Fonte
originária de tudo. Pertencemos a uma comunidade cósmica de vida
tal como foi criada e sustentada por Deus. Somos quem somos somente na relação e por nossa relação com todas
as criaturas e com o próprio Criador; somos alimentados pela mesma seiva divina,
que tudo sustenta com sua mão providente.
Isto
significa que há uma unidade fundamental que perpassa todas as partes do
universo, na forma de uma “rede”. Nós, seres humanos, também fazemos parte
desta vasta rede de inter-relações, conectados a todos os elementos da
natureza, desde a menor célula até a ecologia global.
Sentimo-nos
impulsionados pela seiva do Espírito que alimenta as energias do
universo e a nossa própria energia vital e espiritual. Conectar-se com a videira
possibilita alcançar a seiva, o pulsar da vida e o equilíbrio nas relações;
viver em profunda fusão com a videira desperta as energias criativas,
todas as grandes motivações adormecidas, toda bondade aí presente.
Sem
a seiva divina que nos atravessa nunca poderemos dar o verdadeiro
fruto.
No
entanto, percebemos, no contexto atual, que o ser humano tem perdido o contato e a comunhão com o cosmos e com os seus semelhantes, recusando receber
a seiva que a todos alimenta; ele está conec-tado com tudo e com todos
e, no entanto, tal conexão não lhe nutre, nem lhe oferece sentido à sua
exis-tência. A compulsão dos meios eletrônicos o ameaça de superficialidade, de
individualismo e de isolamen-to. Isto tem provocado nele toda espécie de
mal-estar, de doenças, de conflito e divisão, de insegurança, de ansiedade, de
solidão, de aridez existencial... É aguda a consciência de uma fragmentação do eu
interior.
A
verdadeira nobreza do ser humano consiste nisto: há nele “algo” de interior, decorrente
de sua profun-da conexão com a Videira, de onde recebe a seiva
que o nutre e o faz entrar em relação com tudo e com todos; há nele uma força
latente, como uma energia fundamental, que o impulsiona a viver, que o ajuda a
crescer e a melhorar continuamente, aumenta a sua capacidade de resistência,
estimula-o a alcançar aqui-lo que é o sentido de sua própria existência: a
verdade, a liberdade, o bem, o amor...
Com
a presença desta força interior, a pessoa se sente guiada pelo
seu dinamismo, que lhe proporciona saúde física, lucidez mental e limpidez
afetiva. É esta força que comanda os melhores momentos da vida humana como um
princípio ativo, dinâmico, criativo... Tais forças primordiais,
vitais, presentes nas dife-rentes etapas do crescimento, são essenciais ao ser
humano, graças às quais ele se orienta diante das soli-citações da vida pessoal
e das múltiplas escolhas, constrói a sua vida pessoal, reforça as relações comu-nitárias
e sustenta o seu compromisso solidário no caminho em direção à plenitude do seu
ser.
Quando
esta “força vital” permanece bloqueada, o ser humano perde a
direção, seca a criatividade e o gosto por viver, não faz progredir a sua
potencialidade e demite-se da própria vida.
É
decisivo religar-se à Fonte e aproveitar, para o desenvolvimento
integral da personalidade, os abundan-tes nutrientes e recursos presentes nas
profundezas do coração humano. São forças construtivas e autôno-mas,
livres de influências externas, que devem ser colocadas a serviço da construção
de uma personalidade sadia, equilibrada e mais rica. Com isso, todo seu
interior se alarga e se dilata.
A
seiva de nosso ser essencial constitui nossa autêntica vida.
Descobri-la, abrir-nos a ela, fazer-nos trans-parentes a ela e vivê-la cada dia
constituem a plenitude de nossa realização.
É seiva divina, presente
no eu mais profundo, que nos arranca de nosso fechamento e nos faz ir para além
de nós mesmos; ela nos abre a uma
Realidade maior que nos transcende; é ela que nos faz perceber que temos no
coração um espaço que está feito à medida de Deus.
Precisamos
viver mais nas raízes de nosso ser; precisamos aprender a viver
de uma maneira mais profun-da e autêntica, a partir do núcleo mais íntimo de
nosso ser, a partir de nosso ser essencial.
E viver a partir de nosso ser
essencial é nossa autêntica realização e plenitude. É chegar a integrar
e harmonizar todos os níveis de nossa pessoa: corpo, mente, afetividade,
coração... com a fonte de nossa vida. Intuímos um poço tão
precioso dentro de nós, uma fonte tão profunda... Muitas vezes, passamos
a vida buscando água em poços alheios, e não descobrimos nosso manancial.
Trata-se de descer em profundidade, de
achar o nosso centro, aquele ponto de gravidade por onde passa o eixo
do nosso equilíbrio pessoal. A oração nos ajuda a encontrá-lo e a
ampliá-lo.
É
nesse conjunto de recursos e dinamismos vitais que
a Graça (seiva) de Deus trabalha; Ela pode ser considerada como uma
presença dinâmica, um estimulante das energias latentes do eu.
A
presença da seiva é um reforço, um suporte, um energético do eu, uma
ativadora das capacidades do eu; ela não constrange, não violenta, mas
ajuda, esclarece, mobiliza as energias presentes, facilita largamente a missão
de cada um.
Mais ainda, o Espírito
habita nosso ser profundo, sustenta nossas energias sadias, aumenta nossas
forças, compromete-nos a crescer de forma autônoma. Ele age como um “princípio
dinâmico” e como um “energético ativo”, que reforça as
atividades criativas do eu. Temos de viver a partir do Espírito,
trans-formando e vitalizando nossos gestos, pensamentos, compromissos,
encontros.
Na oração: Eu canto por ser ramo, unido à Videira. Sou ramo que se
alarga, ampli-
ando a minha vida. Eu deixo vida
feita folha verde e cachos de uvas. Sou ramo
e jorro minha vida feito vinho
saboroso. Sou ramo desde a origem.
Sou ramo ligado à Videira. Sou ramo alimentado pelo vigor incontido da seiva.
Alguém vive em mim no silêncio. Alguém que
conhece o bem, a verdade, a líber-dade. Levo
a Videira em minhas entranhas como um canto de libertação. Meu “interior”
conhece a Videira. Conhece a Vida.
Sua Vida é minha vida. Seu viver é meu viver. Para mim, a vida é sua Vida. Sou ramo. Meu interior conhece a seiva da Videira. É algo como
o espírito que me anima.
É algo que me “marca”, que me dá identidade. Se a Videira não me tivesse
dado sua vida através de sua seiva,
hoje eu não seria ramo.
Sou ramo e
deixo a seiva transbordar em mim. A Videira se fez minha liberdade e minha força. A
Videira
me deu um nome: ramo. Sou peregrino
no “silêncio”.
Sou ramo e o
serei para sempre. Ramo sem
fronteiras. Ramo sem cálculos. Ramo transbordante.
Sou para a aventura, sou para o desconhecido,
sou para o novo, sou para o amanhã...
Sou fecundo como a Videira. Eu sei que
em minha Vida há raízes eternas. Eu sei que vivo desde a
origem. Eu sei que me alargarei
enquanto chegue a vida da Videira.
Sou ramo e
quero gritar bem alto. Sou ramo e
vivo. Amo minha vida e não quero
abafá-la. Amo minha vida e não quero morrer sufocado, desconectado da Videira.
Grito a ti Videira, Fonte de minha vida!
Nenhum comentário:
Postar um comentário