quarta-feira, 9 de março de 2011

Saudades !!

Um dia... você vai ter saudades!

Será que existe saudade aos 17, 18 anos?
Quando olho, mesmo de longe, meus quase ex-alunos, quando os vejo discutindo planos, construindo sonhos, a impressão que tenho é que só o futuro importa, que tudo é uma imensa expectativa pelo que vai ainda acontecer.
E quando tudo é esperança, difícil pensar em saudade. A não ser que a própria esperança já seja uma forma de saudade, ‘a saudade do que ainda há de vir...’
Mas a agitação desses jovens não deixa espaço para muita poesia. Nessa idade, eles querem encher cada segundo de vida com emoção e novidade. Às vezes parecem querer largar tudo, jogar pra cima e sair pelo mundo ‘sem lenço e sem documento’ para ver o que é que a vida tem pra mostrar... Às vezes, eles dão a impressão de que não estão nem aí...
Então, me pergunto se todo este esforço feito em atividades da Pastoral, DDFs, encontros, retiros, Estágios Sociais, se valeu realmente a pena. Quando sinto os corações e mentes dos alunos do 3° ano totalmente envolvidos por fórmulas, textos, mapas, índices, estatísticas, arranjos, combinações, números, datas e nomes... Quando o deus-vestibular parece ocupar todos os altares, não deixando espaço nem mesmo para a saudade... tudo parece perder o sentido...
A não ser que...
Onde houver amor e ausência... certamente haverá saudade.
O Colégio Loyola ainda é presença. Por pouco tempo. Lugares e coisas, momentos e pessoas vão, lentamente, adquirindo um inequívoco ar de despedida. Em cada sala, em cada imagem, em cada encontro pelos corredores e pátios, em cada olhar e sorriso que se cruza... vai ficando anunciada uma imensa possibilidade de saudade.
Mas agora não. Agora a cabeça e o coração já tem muito com que se ocupar e preocupar. Terminamos uma etapa, fechamos portas e abrimos outras num rito de passagem que se repetirá pela vida afora, pois ela, a Vida, é assim, terminar algo leva sempre a um recomeçar, sempre um ‘vir a ser’ enquanto vida existir. E o agora é um tempo que nem tem tempo pra pensar direito, quanto mais sentir saudade.
Mas do meu cantinho, teimosamente eu aviso: um dia, pode escrever, você vai sentir saudade...
De tanta coisa...
Do tempo do Primário, da merendeira e da pasta Brasil, da Primeira Eucaristia, da primeira professora e de todas as ‘tias’. Da merenda dividida, esquecida, no inesquecível lanche coletivo. Da turma crescendo junto. Da infância que foi virando adolescência e anunciando a juventude. Tudo rápido demais.
Festas, passeios, gincanas, torneios. O Colégio fazendo 50 anos e nós lá, vivendo e contando a História.
Saudade da mochila velha, daquela carteira disputada, dos lugares secretos, da última página do caderno que guardava bilhetes contrabandeados que falavam de segredos que todos sabiam.
Saudades do quadro cheio de fórmulas indecifráveis, dos textos e exercícios intermináveis. Saudade (acredite!) até das bimestrais!
Saudades dos professores que permitiram aos alunos invadir o precioso espaço da amizade.
Saudades dos funcionários ‘chegados’ e daqueles que passaram silenciosos e anônimos pelos corredores do nosso cotidiano. Saudades das quadras, do morrinho e do campão (que agora, definitivamente, ficaram na saudade). Saudades das celebrações na Capela e da bendita Sala de Almofadas. Saudades do cantinho aconchegante da Pastoral.
Saudades da amizade vivida e celebrada ao nível do mar (na Biologia Marinha) e no alto da serra da Piedade (na Terceirada)...
Saudades dos encontros, DDFs, Gávea, Itaici, Vila Fátima. Saudades das creches e Rondas, do Projeto Alegria (nos hospitais) e da Missão Rural. Saudades de tantos lugares e momentos mágicos que nos ajudaram a SER MAIS. Saudades dos passeios e excursões e suas histórias que aumentam ainda mais as nossas saudades
Saudades do primeiro amor (lembra?) e de todos os amores.
Saudades de quem se foi antes da hora (de qualquer hora!) deixando em seu lugar, juntinho com a certeza da ressurreição, um espaço ainda maior de melancolia e saudade.
Saudades da alegria que podemos ter em qualquer idade, mas que aos 17, 18 anos, tem um brilho, uma beleza, uma naturalidade difíceis de se repetir.
Assim, minha querida, meu querido ‘quase ex aluno’, gostaria de lhe deixar um ‘quase’ último recado. Creio que falo em nome de todos os educadores com quem você conviveu por todos esses anos, em especial a Equipe de Formação Cristã.
Gostaríamos que o Loyola não fosse apenas saudade. Que ele seja uma referência, uma maneira de olhar o mundo, a vida, as pessoas e se comprometer com algo melhor, maior, mais generoso. Que do alto do privilégio de estudar num grande colégio você possa ter a humildade de enxergar a realidade mais simples e entender que seus talentos e dons, que o seu saber acumulado, que a sua aprovação em qualquer vestibular será apenas inútil erudição se não for colocado a serviço daquilo que vale a pena: Vida, e Vida Plena!
Não existimos para nós mesmos. Somos um presente para os demais. Não somos órfãos nem solitários. Somos FILHOS DE DEUS e IRMÃOS dos homens e do Universo. Não nascemos para viver, apenas. Nascemos para CON-VIVER!
No sonho de Inácio de Loyola, somos Homens e Mulheres PARA e COM os demais!
Assim, quero deixar com você este recado parecido com o que tenho dito a outras gerações de alunos que por aqui passaram, receberam sementes e mais sementes e foram dar frutos pela vida afora, longe de nós, pois essa é a alegria de quem se faz educador: plantar para que outros colham.
Que sua safra para o mundo seja farta e generosa.
Leve com você, junto com meu abraço, muita esperança e, desde já, muita saudade.
Pra terminar, dou a você de presente um poema, pequena jóia de Maria Lúcia Simões (in Contos Contidos - Léo Christiano Editorial Ltda :

SEM LIMITE
Há uma ponte meio quebrada e já muito velha sobre o rio que se avista da minha janela. Foi dali que joguei uma pequena pedra sobre as águas. Formou-se um círculo seguido de outro maior e muitos outros, sendo que o último atingiu a margem oposta..
Agora sei que meu gesto pode alcançar distâncias muito maiores do que minha força...
Lendo este poema, convivendo com você, hoje sei que valeu a pena aquela aula, aquele encontro, aquele DDF, aquela creche, aquela reflexão, que vale a pena ser educador...


Com carinho, Prof. Eduardo Machado Belo Hzte. Novembro de 1994

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