quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Tempo do Espírito



Tempo do Espírito, espírito do tempo

“Aquele sobre quem vires o Espírito descer e permanecer, este é quem batiza com o Espírito Santo”

Neste início do chamado “Tempo Comum”, após a celebração do batismo de Jesus, a liturgia continua nos pedindo e nos propondo que “façamos memória”, mais uma vez, daquele evento tão significativo; desta vez, é-nos oferecida uma passagem tomada do evangelista João. Neste, não se narra o acontecimento do batismo em si, mas ele vai diretamente ao núcleo e nos fala do Espírito, que é o verdadeiramente impor-tante em todos os relatos do batismo de Jesus.
A humanidade de Jesus está inundada do Espírito; é a humanidade do Filho de Deus possuída pelo Espírito, guiada pelo Espírito. Jesus é, por excelência, o homem nascido do Espírito e se deixa conduzir pelo Espírito do Pai, vivendo intensamente o seu tempo presente. “Tempo carregado” da presença do Espírito; por isso, tempo criativo, inspirador...
Com Jesus chega um “novo tempo”,um tempo decisivo para a história da humanidade.
É Deus quem irrompe de maneira definitiva na temporalidade. A partir desse momento, a história fica dividida em dois tempos: o anterior e o posterior a Jesus.
Desta maneira, o Senhor do tempo faz de Jesus o centro e o ponto de referência do tempo dos homens. Todos os acontecimentos do mundo, tanto passados como futuros, encontrarão seu lugar e sentido a partir do “tempo central”, que é o tempo de Jesus.
Por isso, aos seus olhos, as realidades da vida cotidiana se tornam transparências. Jesus as olha com olhos contemplativos; todas lhe falam do Reino de Deus e do Deus do Reino que está a caminho.

O Espírito é o que habita o tempo, e nos habita. Estamos no tempo do Espírito que nos faz perceber o “espírito do tempo”; só assim viveremos o tempo de maneira criativa e ousada, como Jesus.
Não é raro encontrar-nos numa situação na qual vivemos o tempo como um túnel, contínuo, repetitivo... Tempo que absorve, desgasta, esgota... e nos faz entrar numa frenética corrida por rentabilizar ao máximo os minutos e as horas. O tempo torna-se cada vez mais veloz, fugaz, estressante...
Diante desse tempo não há futuro auspicioso, nem esperança que se sustenta. Nesse “tempo apertado” o Espírito não consegue entrar e a nossa maneira de viver fica desabitada e estéril.

Para Jesus, o tempo deve ser recebido em graça e se converte na missão que dá sentido à sua vida neste mundo. Jesus aceita de seu Pai o “dom do tempo” e o encarna na história humana de maneiraoriginal e única. Vivendo “no tempo” Jesus descobre uma presença que completa seu ser, que plenifica sua existência e o inspira a ser presença inspiradora junto àqueles que vivem o tempo como fardo pesado.
Com os olhos fixos na “Hora do Pai”, Jesus mostra com sua mobilidade que, participando no tempohu-mano, não se deixa prender pelas ataduras da preocupação, da ansiedade, da pressa...; Ele busca viver com alegria e prazer cada momento como um dom inesperado.
O Filho do Homem vive na espera paciente de seu momento. Sua sabedoria consiste em saber aguardar que o tempo chegue à sua colheita, sem cair na tentação de forçar sua maturação.

A tirania da agenda, a pressa descontrolada, o ritmo frenético, a antecipação dos acontecimentos, a impaci-ência diante do desejado, a falta de respeito pelo tempo interior das pessoas,... são atitudes que caracteri-zam o ser humano pós-moderno, mas que estão ausentes na pessoa de Jesus.
O Espírito está no coração do tempo; Ele está ali como força explosiva que dá à nossa vida nova dimensão e uma densidade de sentido à nossa existência. De agora em diante, cada um de nossos momentos está cheio de Sua presença, transformando o “kronos” em “kairós”; de agora em diante nada em nossas vidas é insignificante, nem rotineiro. A ação mais simples é transfigurada e assume uma dimensão divina. Nada é banal, nada é comum para alguém que se deixa conduzir pelo Espírito.
É nesse nível do tempo inspirador onde respiram nossos desejos, onde nossa esperança bebe, onde nossos sonhos criam raízes... É nele que podemos moldar a arte de viver.

Nossa biografia humana se estende e se distende no tempo cotidiano. Sob o impulso do Espírito quere-mos viver este tempo de forma extraordinária: queremos enchê-lo de sonhos, de aspirações, de criativi-dade. Queremos viver o tempo intensamente, vivificá-lo, cuidá-lo e artisticamente orientá-lo para aquilo que desejamos. Queremos viver de uma maneira original como tempo de sentido único, como tempo irreversível. Este “tempo presente” é oportuno, precioso e não volta mais. Não há um “segundo tempo”.“A vida não dá duas safras”.
O grande programa da vida é precisamente aprender a viver, acolhendo a novidade e a surpresa de cada tempo. Como o sedento busca a fonte, como o peregrino busca a meta, como o náufrago a orientação do farol, o ser humano vive no rio do tempo; está sempre a caminho; é sentinela do futuro.

O Espírito é “atmosfera de Deus”,“herança de Jesus” e “ambiente de realização do ser humano”; n’Ele a vida adquire profundidade, consistência; n’Ele o tempo é vivido sem sobressaltos e sem pressas.
Carregamos dentro de nós o melhor da vida. Somos uma história sagrada. Exercitar o olhar contemplativo buscando “ler” a vida pessoal e comunitária com o olhar mesmo de Deus.



Deixar o Espírito “pousar sobre nós” é dispor-nos a algo grande. A missão que Ele nos anima a viver é alucinante, imenso, fora do nosso tempo rotineiro. É Ele que nos faz mais lúcidos, mais sensíveis, muito mais corajosos para descobrir a profundidade e a riqueza de tudo o que acontece ao nosso redor e dentro de nós. Somos feitos disso: desejo, busca, esperança... No mais profundo de cada um há uma carência que nos faz clamar:“Vinde Espírito Santo!”

Texto bíblico:Jo 1,29-34

Na oração: Enquanto seguidores de Jesus, não somos homens e mu-
lheres escravos da regularidade, dos costumes, dos horá-rios e das normas; somos pessoas “tocadas pelo Espírito”, inspiradas por Ele. Fazer “experiência do Espírito” é abrir-se à novidade, criativi-dade, mobilidade...
- Quem prevalece mais em minha vida: o costume, as normas, as expectativas dos outros... ou a inspiração do Espírito?
- Diante das mudanças sociais, eclesiais e pastorais... vejo-me na defensiva? Sou capaz de olhar com simpatia e empatia a sociedade que me cerca e ver nela os sinais do Reino?

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