sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Para rezar o evangelho do domingo - Dia 04/12/11.

TEMPO SEM ADVENTO



Falar do “tempo” não é tão simples e óbvio; de fato, às vezes, é um problema.

Não é raro encontrar-nos numa situação na qual vivemos o tempo como um túnel, contínuo, repetitivo...

Trata-se de um tempo que absorve, devora, desgasta, esgota...; túnel onde só há presente e sua prolonga-ção homogênea. É cenário de uma frenética e acelerada corrida por rentabilizar ao máximo os minutos e as horas. O tempo torna-se cada vez mais veloz, fugaz, estressante... “Kronos” continua a devorar com maior voragem o que cria. Diante disso, não há futuro auspicioso, nem esperança que sustenta...

Um tempo assim só é habitado por mim mesmo, não há lugar para o outro.

Podemos dizer que um tempo assim cheira a mofo, não está arejado...; monstro que nos devora.

Trata-se de um “tempo sem advento”: não vem ninguém, não esperamos ninguém...

Também Deus não consegue entrar em nossos “tempos apertados”.


No entanto, esta forma desabitada, desesperançada e es-téril não é a única maneira de viver nosso tempo. Uma coisa é “viver no tempo” e outra, muito diferente, é “vi-ver o tempo”, dar sentido e orientação à temporalidade. Só neste último modo pode-se transcender e ser senhor do tempo e da situação, viver sem sobressaltos e sem pressas, serenamente... Viver o tempo intensamente, vivificá-lo, cuidá-lo e artisticamente orientá-lo para aquilo que desejamos. Este “tempo presente” é oportuno, precioso e não volta mais. Vivê-lo para além dele, na espera do que deve vir, carregá-lo de intenção e de presença.



A tirania da agenda e a cobrança de resultados não é o único sentido do tempo e muito menos o mais importante. Existe uma dimensão que sustenta, um nível do tempo mais profundo que sempre esteve aí esperando nossas buscas. É neste nível básico onde respiram nossos desejos, onde nossa esperança bebe, onde nossos sonhos criam raízes... É nele que podemos moldar a arte de viver.

É preciso parar e dar tempo a esse nível “de fundo”, escutar e buscar ali o que dá sentido e fundamento aos nossos outros tempos. Quantas vezes acabamos por transformar o momento num produto de enco-menda, sem ousadia e destituído de criatividade.

Mais uma vez, é preciso parar e descer a esse nível do tempo para ir descobrindo uma presença que completa nosso ser, que plenifica nossa existência, a resposta à nossa interrogação...; está aí, vindo em direção à nossa vida, mais uma vez, como sempre esteve.

“Eis que estou à porta e bato: se alguém ouvir minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele comigo” (Apc. 3,20).



Há um dado que é absolutamente evidente nestes tempos pós-modernos: o futuro que vamos construindo “carece de marcas de certeza” (Lefort). Nossa concepção de futuro se atrofiou: vivemos “tempos sem futuro”. Não podemos prever o futuro com segurança. Hoje, o futuro se apresenta a nós muito mais aberto que em qualquer outra época de nossa humanidade. Os conhecimentos, os meios de comunicação, as técnicas... não nos asseguram uma certeza do que virá. Aventurar no futuro torna-se cada dia mais complexo e difuso, pois predomina a incerteza que nós mesmos geramos.

Além disso, vivemos uma geração que teme o futuro; por isso vivemos um “presente esticado” porque o futuro nos apavora. Já que preferimos não imaginar o futuro, alargamos o presente.

Precisamente porque faltam valores e um sentido para a existência é que se irrompe o medo do futuro, a acomodação, o refúgio no efêmero e no imediato, sem raízes e sem esperança. O medo do futuro nos ajuda a entender a mediocridade e o vazio do presente. Ao reduzir nossos sonhos e aspirações ao consu-mo, reduzimos nossa humanidade e nossa vida.



Precisamos voltar a ter um futuro onde ancorar; um futuro que valha a pena  imaginar e que impulsiona as ações de nosso presente; uma esperança que nos dilate. Sem silêncio, sem profundidade, sem a sabedoria que sabe decantar, nunca seremos arrojados e audaciosos frente ao futuro. Existirá somente angústia e medo.

Ir ao encontro do futuro significa reconhecer antes de tudo que Deus está trabalhando conosco e em nós por nosso futuro. Ele vem ao nosso encontro a partir do futuro e fermenta nosso presente para que nos abramos ao futuro. Deus “vela” nossa passagem através da história, como um dia “velou” também enquanto seu povo “saía” da escravidão do Egito (Ex. 12,42).



Nós vamos ao encontro do futuro não como projeção de nossa necessidade de amor, de vida e de felicidade. Também este é um horizonte válido, mas para o cristão não basta. Nós nos dirigimos ao futuro antes de tudo atraídos por Aquele que plenifica nossa vida já desde agora com ingredientes vitais; trata-se de um futuro entendido como fecundidade de nossas raízes, como plenitude de quanto temos saboreado e encontrado previamente. Deus vem do futuro, como plenitude e totalidade; e do “futuro temos saudade”.

Por isso, a verdadeira fé, para ser autenticamente cristã, tem que orientar-se para o futuro.





O futuro está dominado pela irrupção do Reino, está cheio do senhorio de Cristo, está garantido pela ação renovadora do Espírito.

“Deus espera na fila”. Descobrir esta vinda, atribuir a Ele seu lugar em nosso tempo, é viver o Advento. É preparar-nos para nos deixar completar, responder, plenificar... por Quem nos fez abertos ao dinamismo de sentido que nos impulsiona à vida.

Chega o tempo da espera e da esperança, das buscas e dos silêncios...; o tempo de “olhar”  ao redor e descobrir que Deus continua vindo. Sempre. Por caminhos surpreendentes. Toda a nossa vida é Advento.

Deus está no coração do tempo. Deus está ali como força explosiva que dá à nossa vida nova dimensão e à nossa existência infinito valor. De agora em diante, cada um de nossos momentos está cheio de Sua presença, pois a eternidade está no coração do tempo. Deus transforma o “kronos” em “Kairós”.

A invasão da eternidade no tempo confere ao tempo uma plenitude de ser, um peso de realidade e exis-tência, uma densidade de sentido que ele é incapaz de ter por si só. De agora em diante, nada em nossas vidas é insignificante, nem rotineiro. A ação mais simples é transfigurada e assume uma dimensão eterna e divina. Nada é banal, nada é comum para alguém cuja vida mergulha no eterno.



O Advento é tempo de dispôr-se a algo grande. O que estamos esperando é alucinante, imenso, fora do nosso tempo rotineiro. Intuímos que nossos olhos foram criados para uma visão mais profunda, mais humana, mais plena; desejamos ser um pouco mais lúcidos, mais sensíveis, muito mais corajosos para descobrir a profundidade e a riqueza de tudo o que acontece ao nosso redor e dentro de nós.

Tudo na vida requer preparo, e toda preparação exige empenho e mudança..., envolve uma espera.

Somos feitos disso: desejo, súplica, anseio, busca, esperança... No mais profundo de cada um há uma carência que nos faz bradar ao Eterno, pedindo ajuda: “Vem, Senhor, nos salvar! Vem sem demora nos dar a paz!” Tudo aponta para o vazio infinito dentro de nós, ressoando uma certeza: Ele vem!



Textos bíblicos: Is. 52,7-10  Mc. 1,1-8   2Pd.3,8-14



Na oração: “Venho a teu mundo, a tua vida, a tua história”. Como ressoa em mim esta expressão?

                      - Deus entra em minha agenda, em meu tempo? 

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