ESPERANÇA: criatividade enraizada no presente
“Há
uma esperança para o teu futuro”
(Jer. 31,17).
Estamos no penúltimo
domingo do “ano litúrgico B” e a liturgia, ao propor leituras que fazem
referência “aos últimos tempos”, quer nos convidar à “vigilância”;
de modo especial, o evangelho de hoje é tirado do “discurso escatológico” ou
“pequeno apocalipse de Marcos”.
Trata-se de um anúncio
esperançador e certo. A esperança é reforçada pela imagem da figueira
que, carregando-se de brotos, anuncia a primavera. Esse é nosso destino:
caminhamos para uma Primavera que não conhecerá ocaso. A certeza disso está
enraizada na promessa de Jesus: “O
céu e a terra passarão, mas minhas palavras não passarão”.
Na verdade, os
discursos escatológicos e os anúncios apocalípticos, apesar de sua aparência,
são sempre um chamado à esperança. Esperança que não é uma projeção para
um futuro incerto e que serve para fugir do presente ou para poder
“suportá-lo”.
Por este motivo, não
podemos entender a esperança como mera “expectativa” que nos afasta do
presente, na promessa de algo que nos faça sentir melhor em outro tempo e em
outro lugar.
A autêntica esperança,
no entanto, não só não nos afasta do presente, senão nos enraíza nele. Porque,
realmente, só há uma esperança: aquela que corresponde ao desejo de viver
intensamente o “Agora”. Essa é a única coisa que aspiramos: reconhecer-nos e
viver na Plenitude do que é, no Presente pleno, na Presença que somos. Presente
que se abre ao novo futuro. E para este “novo tempo” nos dirigimos quando
nos permitimos viver no coração do Presente, quando nos deixamos encontrar por
ele.
Em meio às sombras, perplexidades,
contradições, provocações e promessas de vida, que constituem o atual momento
histórico, queremos expressar a fé no futuro
da nossa vida.
Ainda que soframos ventos contrários e as
nuvens se adensem no horizonte, sabemos e confessamos com o profeta, e pela
graça do Espírito, que existe futuro.
Para ser fiel, é preciso
seguir o Espírito, deixando-se surpreender pelos novos rumos que Ele aponta,
seduzir pelos novos horizontes que Ele descortina, desafiar pelas novas
provocações que Ele lança, a partir da realidade histórica e dos novos sinais
dos tempos.
Essa relação viva e dinâmica com o Espírito é fundamental para a vida
cristã, em qualquer circunstância
A esperança
é algo constitutivo no ser humano. Para ele, viver é caminhar para um futuro.
Sua vida é sempre busca de algo melhor. O ser
humano “não só tem esperança, senão que vive na medida em
que está aberto à esperança e é
movido por ela”
(H. Mottu).
Por isso, quando numa sociedade se perde a
esperança, a vitalidade atrofia, a marcha se paralisa e a vida mesma corre o
risco de degradar-se.
A esperança,
hoje como sempre, não é virtude de um instante. É a atitude fundamental e o estilo
de vi-
da daqueles
que enfrentam a existência “enraizados e edificados em
Jesus Cristo”
(Col.2,6)
A esperança
se constrói dia a dia “enraizando” nossa vida no Senhor. É
em meio desta sociedade onde
nós cristãos procuramos “dar
razão de nossa esperança”(1Pd.
3,15).
A esperança
há de ser arriscada. Ela não é a virtude própria dos momentos fáceis.
Ao contrário, a esperança cristã cresce, se purifica e
se enriquece em meio aos conflitos.
“... porque é mais belo o risco ao lado da
esperança que a certeza ao lado de um universo
frio e sem
sentido...” (Rubem
Alves).
A esperança
cristã é chamada a “abrir horizonte” ao ser humano
contemporâneo. No meio desta nossa
história, às vezes
medíocre e insensata, está se gestando o verdadeiro futuro do ser humano.
Frente a uma “visão imediatista” da
história, sem meta e sem sentido algum, a esperança
cristã leva a sério todas as possibilidades
latentes na realidade presente.
Precisamente porque quer ser realista e lúcido, o cristão se aproxima
da realidade, vendo-a como algo inacabado e “em marcha”; não aceita
as coisas “tal como são”, mas “tal como deverão ser”.
Quem ama e espera (esperançar) o futuro (“novos céus, nova
terra”) não
pode “conformar-se”
com a realidade tal como é hoje.
A esperança não tranquiliza,
inquieta; introduz “contradição” com a realidade; gera protesto; nos des-
perta da
apatia e da indiferença próprias do ser humano contemporâneo; nos desinstala.
A esperança
cristã destrói os “germes de resignação” da sociedade
moderna e combate a “atrofia espiritual” dos satisfeitos. Por isso, a esperança
cristã não é só “interpretação” do mundo e da condição humana. É esforço de
transformação. Introduz na sociedade sede de justiça e compromisso de huma-nização.
Aquele que
vive com esperança se sente
impulsionado a fazer o que espera.
O futuro
que espera se converte em projeto de ação e compromisso.
E este compromisso é precisamente o que gera esperança no mundo.
Como desencadear hoje esta esperança na sociedade atual?
- Frente ao pragmatismo científico técnico, a esperança defende a pessoa.
- Frente ao individualismo, a esperança
alimenta a solidariedade.
- Frente à insensibilidade, a esperança
desperta a misericórdia, a ternura,
a acolhida, a compaixão
comprometida...“onde não há coração, não
cresce
a
esperança”.
- Frente à violência, a esperança
cria condições para o diálogo e reconciliação.
O perdão
é um gesto de confiança no ser humano;
engendra esperança.
- Frente à incredulidade e o vazio existencial, a esperança fortifica a fé em De-
us. O ser humano necessita do “Deus
da esperança”. Ele é o fundamento último sobre o qual poder apoiar
sua confiança radical na vida.
Texto
bíblico: Mc. 13,24-32
Na oração: quê esperança você
carrega no coração?
Nenhum comentário:
Postar um comentário